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quarta-feira, 12 de janeiro de 2022

 


2.          Tentativa e erro!

Julgo que posso afirmar que este é o único algoritmo que a natureza conhece. Utilizado “infilhões[1]” de vezes desde que a vida se formou e assim deverá continuar a acontecer.

O mundo está em constante alteração. Nada será eternamente como sempre foi. Nem o próprio universo é imutável (tanto quanto se sabe).

Obviamente, não podemos ignorar que a dimensão e frequência das alterações (também, mas não só) dependem da escala de espaço e tempo que estivermos a considerar.

Alterações estruturais no planeta Terra dão-se a um ritmo muito inferior às que ocorrem em uma noz (apenas para dar um exemplo extremo).

A evolução depende da adaptação a um meio envolvente em constante mudança (mesmo que os ritmos difiram).

Inicialmente, quando a vida começou no planeta Terra (há três mil e setecentos milhões de anos) a reprodução era assexuada (um ser dava origem a outro). O processo mais comum da reprodução assexuada consistia na divisão em dois.

Este tipo de reprodução relativamente simples, mais rápida e eficaz do que a reprodução sexuada (na qual dois dão origem a um) gera indivíduos idênticos àqueles que os originaram, não promovendo tanta variabilidade genética.

Imagine que uma população de organismos é atacada por um vírus. A probabilidade de ser extinta é tanto maior quanto menor for a variabilidade genética dessa mesma população.

No entanto, devido às mutações, a variabilidade genética sempre existiu, mesmo quando só havia este tipo de reprodução (assexuada).

A variação/mutação genética ocorre em todos os organismos vivos (incluindo vírus) e é a principal causa da diversidade biológica da espécie.

Ocorrendo uma mutação, caso haja adaptação ao meio, pode tornar-se a característica dominante.

Se a nova versão for mais vantajosa, substituirá gradualmente a anterior. Caso funcione melhor nalgumas circunstâncias, mas pior noutras, poderá ser encontrado um equilíbrio com a versão anterior, de tal modo que uma parte da população tenha a primeira e a restante, a segunda. Nesse caso, esse gene teria duas variantes diferentes, o que acontece com uma grande percentagem de genes.

O sucesso, reflete-se no número de descendentes que vão herdar essa nova característica. Torna-se predominante na medida do êxito da sua transmissibilidade através da reprodução.

Para se reconhecer uma mutação deve-se comparar a variação genética com um padrão considerado normal. O genoma referência (aquele que é considerado padrão) são as sequências mais comuns, observadas em determinada população.

Ao passarmos para a reprodução sexuada houve ganhos de eficiência por se aumentar as fontes de variabilidade genética (deixa de ser apenas a mutação)

Mesmo que a reprodução se repita, os descendentes serão sempre diferentes, porque a carga genética dos gâmetas (óvulo e espermatozoide) é sempre única.

A exceção ocorre com gémeos idênticos porque nesse caso os gâmetas são os mesmos (o mesmo espermatozoide e o mesmo óvulo originam mais do que um descendente).

Já as mutações genéticas ocorrem durante o processo de interpretação do código genético. Se houver uma falha na leitura que provoque uma alteração na sequência de bases na molécula de DNA constituinte do gene, isso pode levar à alteração de uma determinada característica do organismo vivo.

A partir desse momento, entra em jogo a seleção natural. Se estivermos perante uma bem-sucedida adaptação ao meio envolvente, caso haja reprodução, a alteração genética passa para a futura geração, e pode vir a tornar-se na característica predominante.

No Caso do vírus Covid-19 também já assistimos a várias mutações. As quatro variantes classificadas pela OMS como de preocupação - Alfa (Reino Unido), Beta (África do Sul), Gama (Brasil) e Delta (Índia) - estão presentes na União Europeia e todas apresentam transmissão comunitária. Entretanto surgiu a Ómicron, com muito mais mutações que as anteriores, e que já está a caminho de se tornar dominante em todo o mundo.

Chama-se a esse processo de experimentar se uma determinada mudança (mutação genética) vai ou não se adaptar ao meio ambiente envolvente, de tentativa e erro.

Tentativa porque não houve planeamento. Não foi “vamos experimentar fazer aqui uma alteração para ver o que isto vai dar”. Muito menos “vamos experimentar fazer aqui uma alteração para ver se dá o que estamos a pensar”.

Foi uma falha na interpretação do código genético que causou uma alteração que quando estiver no seu meio ambiente pode (ou não) adaptar-se. Se tiver sucesso (na adaptação) pode tornar-se (ou não) na característica dominante.

Erro porque na grande maioria das vezes tal não acontece (a mutação não vinga). São muito mais os casos em que não resulta do que os êxitos.

É sem dúvida impressionante pensar que a vida neste planeta começou há três mil e setecentos milhões de anos através da combinação de elementos químicos que em última análise tiveram origem (tal como tudo) há sensivelmente treze mil e oitocentos milhões de anos, com a explosão do Big Bang[2].

Cada átomo de oxigênio que inspiramos, assim como cada átomo de cálcio que está nos nossos ossos ou de ferro e de carbono na nossa musculatura, tiveram uma origem muito específica: os elementos químicos indispensáveis para manter a nossa estrutura física, estão intimamente ligados com a origem do universo (e principalmente com as estrelas).

O surgimento de elementos químicos envolveu processos de fusão e fissão nuclear. Ou seja, processos em que átomos podem ser fundidos (fusão) ou divididos (fissão). De um modo geral tais eventos são conhecidos como nucleossíntese.

O primeiro processo de nucleossíntese natural foi o Big Bang, com uma produção massiva de elementos (e seus isótopos) químicos que estão ali[3] no início da tabela periódica – hidrogênio e hélio.

Seguindo essa tabela periódica, os três elementos seguintes foram o lítio, berílio e boro em processos de fragmentação de elementos mais pesados pela ação de raios cósmicos.

Elementos a partir do carbono podem ser formados em processos que ocorrem em estrelas. Alguns elementos podem ser formados em estrelas não muito maiores do que o nosso Sol, enquanto outros elementos, com mais protões e neutrões, precisam de condições mais drásticas, encontradas em estrelas mais massivas.

Outro processo foi a explosão de Supernovas que possuem massas maiores do que dez vezes o nosso Sol, com a possibilidade de dar vazão a vários processos nucleares de alta energia.

O Sol já é uma estrela de terceira geração, e graças a isso a composição química do sistema solar é rica o suficiente para formar a vida como a conhecemos.

A vida formou-se (provavelmente) após muitas tentativas, e de certo modo consegue manter-se porque desenvolve a capacidade de ir registando todos os processos já alcançados para não ter que estar sempre a começar do zero.

Para se manter precisa de se reproduzir e para evoluir tem que se adaptar sempre que necessário.

Foi assim, com este único algoritmo e com muitos milhões de anos que chegámos até onde estamos.

No entanto, já podemos dizer que a nossa presença veio trazer instabilidade a todo este processo, independentemente de todas as tentativas e erros que nunca cessaram de acontecer com todos os seres vivos (inclui vírus).

A ação humana tem alterado drasticamente o funcionamento e os fluxos naturais do planeta ao promover intensas mudanças globais, de tal modo que diversos especialistas afirmam que entramos em um novo período geológico, o Antropoceno.

O ser humano já é capaz de desenvolver algoritmos muito mais complexos que a natureza, porque não se baseiam apenas numa tentativa ao acaso, procuram eliminar hipóteses ou até mesmo acertar numa solução. 

Claro que em termos de tempo, a natureza leva um avanço descomunal que se reflete no número de tentativas já realizadas (isto sem referir que a natureza está constantemente, em todo o lado, a tentar). Talvez o desenvolvimento do computador quântico nos ajude a encurtar um pouco essa desvantagem. Mas acima de tudo, a nossa vantagem poderá estar na capacidade de desenvolver algoritmos complexos que nos ajudem a encontrar respostas.



[1] Expressão para dizer que foram tantas as vezes que se perdeu a conta.

[2] http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142006000300022

[3] https://www.tabelaperiodica.org/como-surgiram-os-elementos-quimicos/


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