2.
Tentativa e erro!
Julgo que posso afirmar que
este é o único algoritmo que a natureza conhece. Utilizado “infilhões[1]” de
vezes desde que a vida se formou e assim deverá continuar a acontecer.
O mundo está em constante
alteração. Nada será eternamente como sempre foi. Nem o próprio universo é
imutável (tanto quanto se sabe).
Obviamente, não podemos
ignorar que a dimensão e frequência das alterações (também, mas não só) dependem
da escala de espaço e tempo que estivermos a considerar.
Alterações estruturais no
planeta Terra dão-se a um ritmo muito inferior às que ocorrem em uma noz
(apenas para dar um exemplo extremo).
A evolução depende da
adaptação a um meio envolvente em constante mudança (mesmo que os ritmos difiram).
Inicialmente, quando a vida
começou no planeta Terra (há três mil e setecentos milhões de anos) a
reprodução era assexuada (um ser dava origem a outro). O processo mais comum da
reprodução assexuada consistia na divisão em dois.
Este tipo de reprodução
relativamente simples, mais rápida e eficaz do que a reprodução sexuada (na
qual dois dão origem a um) gera indivíduos idênticos àqueles que os originaram,
não promovendo tanta variabilidade genética.
Imagine que uma população de
organismos é atacada por um vírus. A probabilidade de ser extinta é tanto maior
quanto menor for a variabilidade genética dessa mesma população.
No entanto, devido às
mutações, a variabilidade genética sempre existiu, mesmo quando só havia este
tipo de reprodução (assexuada).
A variação/mutação genética
ocorre em todos os organismos vivos (incluindo vírus) e é a principal causa da diversidade
biológica da espécie.
Ocorrendo uma mutação, caso
haja adaptação ao meio, pode tornar-se a característica dominante.
Se a nova versão for mais
vantajosa, substituirá gradualmente a anterior. Caso funcione melhor nalgumas circunstâncias,
mas pior noutras, poderá ser encontrado um equilíbrio com a versão anterior, de
tal modo que uma parte da população tenha a primeira e a restante, a segunda.
Nesse caso, esse gene teria duas variantes diferentes, o que acontece com uma
grande percentagem de genes.
O sucesso, reflete-se no
número de descendentes que vão herdar essa nova característica. Torna-se
predominante na medida do êxito da sua transmissibilidade através da reprodução.
Para se reconhecer uma mutação
deve-se comparar a variação genética com um padrão considerado normal. O genoma
referência (aquele que é considerado padrão) são as sequências mais comuns,
observadas em determinada população.
Ao passarmos para a reprodução
sexuada houve ganhos de eficiência por se aumentar as fontes de variabilidade
genética (deixa de ser apenas a mutação)
Mesmo que a reprodução se
repita, os descendentes serão sempre diferentes, porque a carga genética dos
gâmetas (óvulo e espermatozoide) é sempre única.
A exceção ocorre com gémeos
idênticos porque nesse caso os gâmetas são os mesmos (o mesmo espermatozoide e
o mesmo óvulo originam mais do que um descendente).
Já as mutações genéticas
ocorrem durante o processo de interpretação do código genético. Se houver uma
falha na leitura que provoque uma alteração na sequência de bases na molécula
de DNA constituinte do gene, isso pode levar à alteração de uma determinada característica
do organismo vivo.
A partir desse momento, entra
em jogo a seleção natural. Se estivermos perante uma bem-sucedida adaptação ao
meio envolvente, caso haja reprodução, a alteração genética passa para a futura
geração, e pode vir a tornar-se na característica predominante.
No Caso do vírus Covid-19
também já assistimos a várias mutações. As quatro variantes classificadas pela
OMS como de preocupação - Alfa (Reino Unido), Beta (África do Sul), Gama
(Brasil) e Delta (Índia) - estão presentes na União Europeia e todas apresentam
transmissão comunitária. Entretanto surgiu a Ómicron, com muito mais mutações
que as anteriores, e que já está a caminho de se tornar dominante em todo o
mundo.
Chama-se a esse processo de experimentar se uma determinada mudança
(mutação genética) vai ou não se adaptar ao meio ambiente envolvente, de tentativa e erro.
Tentativa porque não houve
planeamento. Não foi “vamos experimentar fazer aqui uma alteração para ver o
que isto vai dar”. Muito menos “vamos experimentar fazer aqui uma alteração
para ver se dá o que estamos a pensar”.
Foi uma falha na interpretação
do código genético que causou uma alteração que quando estiver no seu meio
ambiente pode (ou não) adaptar-se. Se tiver sucesso (na adaptação) pode tornar-se
(ou não) na característica dominante.
Erro porque na grande maioria
das vezes tal não acontece (a mutação não vinga). São muito mais os casos em
que não resulta do que os êxitos.
É sem dúvida impressionante
pensar que a vida neste planeta começou há três mil e setecentos milhões de
anos através da combinação de elementos químicos que em última análise tiveram
origem (tal como tudo) há sensivelmente treze mil e oitocentos milhões de anos,
com a explosão do Big Bang[2].
Cada átomo de oxigênio que
inspiramos, assim como cada átomo de cálcio que está nos nossos ossos ou de
ferro e de carbono na nossa musculatura, tiveram uma origem muito específica:
os elementos químicos indispensáveis para manter a nossa estrutura física,
estão intimamente ligados com a origem do universo (e principalmente com as
estrelas).
O surgimento de elementos
químicos envolveu processos de fusão e fissão nuclear. Ou seja, processos em
que átomos podem ser fundidos (fusão) ou divididos (fissão). De um modo geral
tais eventos são conhecidos como nucleossíntese.
O primeiro processo de
nucleossíntese natural foi o Big Bang, com uma produção massiva de elementos (e
seus isótopos) químicos que estão ali[3] no
início da tabela periódica – hidrogênio e hélio.
Seguindo essa tabela
periódica, os três elementos seguintes foram o lítio, berílio e boro em
processos de fragmentação de elementos mais pesados pela ação de raios
cósmicos.
Elementos a partir do carbono
podem ser formados em processos que ocorrem em estrelas. Alguns elementos podem
ser formados em estrelas não muito maiores do que o nosso Sol, enquanto outros
elementos, com mais protões e neutrões, precisam de condições mais drásticas,
encontradas em estrelas mais massivas.
Outro processo foi a explosão
de Supernovas que possuem massas maiores do que dez vezes o nosso Sol, com a
possibilidade de dar vazão a vários processos nucleares de alta energia.
O Sol já é uma estrela de
terceira geração, e graças a isso a composição química do sistema solar é rica
o suficiente para formar a vida como a conhecemos.
A vida formou-se (provavelmente)
após muitas tentativas, e de certo modo consegue manter-se porque desenvolve a
capacidade de ir registando todos os processos já alcançados para não ter que
estar sempre a começar do zero.
Para se manter precisa de se
reproduzir e para evoluir tem que se adaptar sempre que necessário.
Foi assim, com este único
algoritmo e com muitos milhões de anos que chegámos até onde estamos.
No entanto, já podemos dizer
que a nossa presença veio trazer instabilidade a todo este processo,
independentemente de todas as tentativas e erros que nunca cessaram de acontecer
com todos os seres vivos (inclui vírus).
A ação humana tem alterado
drasticamente o funcionamento e os fluxos naturais do planeta ao promover
intensas mudanças globais, de tal modo que diversos especialistas afirmam que entramos
em um novo período geológico, o Antropoceno.
O ser humano já é capaz de
desenvolver algoritmos muito mais complexos que a natureza, porque não se
baseiam apenas numa tentativa ao acaso, procuram eliminar hipóteses ou até
mesmo acertar numa solução.
Claro que em termos de tempo,
a natureza leva um avanço descomunal que se reflete no número de tentativas já
realizadas (isto sem referir que a natureza está constantemente, em todo o lado,
a tentar). Talvez o desenvolvimento do computador quântico nos ajude a encurtar
um pouco essa desvantagem. Mas acima de tudo, a nossa vantagem poderá estar na
capacidade de desenvolver algoritmos complexos que nos ajudem a encontrar
respostas.
[1]
Expressão para dizer que foram tantas as vezes que se perdeu a conta.
[2]
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142006000300022
[3]
https://www.tabelaperiodica.org/como-surgiram-os-elementos-quimicos/
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