Se formos… Que seja de mãos dadas!
Provavelmente já terá visto em
filme aquela velha história do miúdo mais forte que passa a vida a infernizar o
miúdo franzino. Geralmente, aquele, tende para se meter em sarilhos e acaba por
cair numa vida de delinquência, enquanto a sua vítima se esforça para
ter um futuro melhor.
A certa altura, o malandro
sai de cena. Ou porque tem um acidente grave ou porque vai para uma casa de
correção...
O que importa é que deixam de
se cruzar.
Um, teve uma vida atribulada
com constantes entradas e saídas de estabelecimentos prisionais, ao passo que o
outro, teve uma vida “dita normal”, contribuindo dentro das suas
possibilidades, mas de forma positiva, para o progresso da comunidade onde está
integrado.
Durante algum tempo, o mais
forte, batia e aterrorizava o mais fraco. Felizmente, nunca lhe causou uma
lesão grave.
Apesar de mais forte
fisicamente, era na realidade mais fraco em muitos outros aspetos.
Muita gente ainda defende o
conceito restritivo do “mais forte”. Hoje sobrevivem bebés que noutros tempos
teriam morrido por falta de cuidados médicos, mas que crescem, e acabam por se
tornar adultos. Muitos, conseguem obter inequívoco sucesso, nas mais diversas
áreas.
O mais forte fisicamente desta
estória, não trouxe nada de positivo para a sociedade.
A área da Rússia é 28 vezes
maior que a da Ucrânia e tem uma população mais de três vezes superior.
Fazendo um paralelismo com a
estória de cima, é claramente aquele que bate nos mais fracos.
Claro que a complexidade desta
segunda narrativa é outra.
A Rússia tinha um grande
objetivo quando decidiu invadir a Ucrânia: impedir que esta se tornasse num
país livre, próspero e desenvolvido.
É inadmissível para alguém
como Vladimir Putin que um país vizinho da “Grande Rússia”, ainda por cima que
fez parte da antiga URSS, queira viver num regime totalmente diferente, e pior
que isso, com sucesso. Isso levaria o povo russo a levantar várias questões.
Algo que não interessa nada a um ditador (que o seu povo comece a interrogar-se).
A forma ideal de concretizar
esse objetivo seria fazer da Ucrânia uma espécie de Bielorrússia. Para além de
outras, traria certamente vantagens económicas.
Não tendo obtido sucesso no
plano inicial, a fase B incluía três objetivos para alcançar a meta final:
impedir a Ucrânia de ser um país livre, democrático, próspero e desenvolvido.
1) Destruir a Ucrânia e as
suas estruturas económicas para os atrasar o mais possível;
2) “Abocanhar mais uma fatia
do bolo”. Depois da Crimeia, irá tentar a região do Donbass.
3) Retirar aos ucranianos o
acesso ao mar. Mais uma forma de os prejudicar economicamente (restringir a
saída e entrada de mercadorias aos países vizinhos a ocidente).
Admitindo, nesta fase, que a
Rússia não consegue colocar um governo fantoche na Ucrânia, vou-me cingir aos
três objetivos descritos em cima.
O primeiro podemos dizer que
foi alcançado. Pelas imagens que temos visto na televisão, cidades totalmente
destruídas, incluindo bairros puramente residenciais, e muitas outras
infraestruturas, não restam dúvidas que a Ucrânia vais precisar de tempo e
muitos recursos para voltar ao estado em que estava antes do início desta
guerra.
Quantos prédios de habitação
terão de ser implodidos para construir outro no mesmo lugar?
Mesmo com o auxílio de um
eventual “Plano Marshall”, não é algo que se faça de um dia para o outro e
resta saber com que custos… (geralmente, não há almoços grátis).
Este objetivo por si só, não é
suficiente para Vladimir Putin dizer que ganhou esta guerra, mesmo que o
objetivo de atrasar a Ucrânia tenha sido alcançado.
Seria, no mínimo, muito
difícil de explicar ao seu povo, que todo este esforço, com perdas humanas e
materiais significativas, teve apenas por fim, impedir o mau exemplo dos
Ucranianos.
Putin irá necessitar de algo
mais. Depois da Crimeia em 2014, apoderar-se de mais um pedaço da Ucrânia, mais
precisamente a região do Donbass, pode servir esse intento.
Vedar aos ucranianos o acesso
ao mar, seria o terceiro objetivo, que a somar aos dois anteriores, dava a
Putin a vitória que queria (se não impedir, pelo menos dificultar ao máximo a
capacidade da Ucrânia em ser livre e desenvolvida). Não os tendo conseguido
subjugar, conseguiu deixá-los muito mais fracos (e mais dependentes).
Daqui resultam as próximas
questões: irá a Rússia conseguir apoderar-se da região do Donbass? E em relação
a bloquear o acesso ao mar?
Quanto tempo mais, conseguirá
a Rússia manter esta guerra? E a Ucrânia resistir?
Segundo alguns analistas, a
Rússia não tem muito mais tempo para conseguir alcançar esses objetivos. Como
reagirá Putin se não conseguir sair desta guerra com uma retórica de vitória?
Se sentir que pode sair deste
conflito como derrotado, principalmente aos olhos do seu próprio povo, poderá
levá-lo a cometer uma loucura? Poderá cometer a insanidade de usar armas
nucleares? Se isso vier a acontecer, creio que as repercussões serão
imprevisíveis…
Primeiro, porque foram os
russos que começaram esta guerra, e porque continuam a ser os únicos que lhe
podem por um termo, basta quererem. Mas, mais importante, porque nunca foram
usadas armas com um poder tão destrutivo, simplesmente porque um país não
tolera a liberdade de outro decidir como quer viver.
Todos sabemos que o ser humano
é capaz de matar por questões de teor meramente ideológico, até mesmo por
divergência de narrativa, mas nunca o fez com recurso ao uso de armas de
destruição massiva. Em pleno século XXI, representaria um retrocesso
civilizacional, que alguns poderiam não estar dispostos a tolerar.
Não tenciono construir
cenários catastróficos, mas preocupa-me que a palavra “nuclear” seja tão
frequentemente repetida (parece-me que cada vez mais) pelos mais diversos
analistas.
Não é fácil de prever como tudo
isto irá terminar, mas só posso ser solidário com um povo que defende a sua
liberdade e a sua nação.
Acreditando que a Ucrânia
continuará a ter um futuro, necessitará de uma reconstrução rápida e de um
crescimento económico acelerado, mas também de se armar fortemente.
A Ucrânia tem de fazer tudo o
que estiver ao seu alcance, para impedir que a Rússia destrua as suas
infraestruturas recorrentemente. É impossível prever o que vem do outro lado da
fronteira. Será o recurso ao armamento nuclear a única solução para a Ucrânia?
Por último, tenho dúvidas que
o atual líder da Rússia represente o sentimento dos 140 milhões, ou sequer da
maioria do povo russo. Mas, a verdade é que tem poder para agir em nome de uma
nação que tem um poder de destruição incalculável.
Será razoável que a humanidade
corra o risco de extinção pelo poder de um só homem?
São certamente várias, as
interrogações que ficam a pairar no ar.
Não sei como irá terminar tudo
isto, mas em qualquer dos casos, receio que não seja desta que venhamos a tirar
as devidas ilações.