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sexta-feira, 8 de abril de 2022

 


9.          Dos oito aos oitenta!

Temos uma certa tendência para ir de um extremo ao outro.

Continuando a fazer cenários, ninguém tem dúvidas que uma família com muitos jovens na força da idade conseguiria obter mais rendimentos dos seus trabalhos agrícolas do que famílias com idade avançada, ou outras condições que afetassem a disponibilidade para as tarefas produtivas.

Não seria de estranhar que apesar de estarem a viver uma situação nova (nunca até então alguém tinha trabalhado apenas para si), os elementos do grupo continuassem a juntar-se, por exemplo à noite, à volta de uma fogueira, para partilharem experiências. Também não seria completamente surpreendente que partilhassem alimentos, nomeadamente com elementos do grupo mais necessitados.

Imaginemos que voltam a passar por outra crise. Desta vez, uma praga de insetos que destrói grande parte das colheitas.

A fome volta a atacar este grupo de agricultores, mas é natural que a gravidade não seja a mesma para todos.

Nem todos conseguiram amealhar o mesmo, pelo que é perfeitamente natural que uns consigam resistir melhor.

Os mais desesperados “batem à porta” dos que estão melhor, a pedir ajuda.

É natural que alguns tenham ajudado com o que podiam, mas não é impossível que outros tenham oferecido apoio em troca de mais tarde serem ressarcidos.

Nasce assim a dívida que durante milhões de anos não tinha dado sinais de vida.

Mas as coisas, como todos sabemos, podem sempre piorar.

Imagine que luta para pagar o que deve mas a certa altura, problemas inesperados, agravam ainda mais a situação.

Desesperado entrega o seu terreno para saldar a dívida e passa a trabalhar no terreno do outro em troca de alimento.

Mais dois nascimentos: o patrão e o assalariado.

Todos sabemos que o desenvolvimento não se ficou por aqui…

Os anos foram passando e aquele grupo foi crescendo até se transformar numa cidade-estado, mais tarde num reino ou até em um império.

O crescimento das desigualdades não foi menor, e não muito tempo depois, no máximo umas centenas ou milhares de anos depois (uma ínfima parte da nossa existência), temos Reis, Imperadores ou Faraós, donos de riquezas incalculáveis, enquanto a maioria dos seus súbditos passava fome ou vivia com muto pouco.

Quem no seu bom juízo, tirando essa pequena minoria, não sentiria falta dos tempos de caçador-coletor? Seria perfeitamente normal, caso ainda tivessem memória, o que certamente já não seria o caso, que muitos se interrogassem: porque diabos nos fomos meter nesta?

As regras do jogo tinham mudado definitivamente. Nunca em muitos milhares de anos de existência tínhamos conseguido criar tanto excedente, mas também nunca tínhamos vivido de forma tão miserável.

Mas não foi apenas a fome. De repente, aqueles com quem pouco tempo antes partilhávamos a vida, que faziam parte da nossa equipa, como de uma família se tratasse, de um momento para o outro, passam a desprezar-nos e a tratar-nos sem um mínimo de consideração.

Felizmente, hoje, alguns milhares de anos depois, podemos afirmar que esta situação, de um modo geral, melhorou, embora mais em alguns locais do que na maioria dos outros.

Hoje, cerca de dez mil anos depois desta aventura ter-se iniciado, temos estados, governos, instituições, leis, especialistas, exércitos e polícias, hospitais e universidades. Temos muitas coisas, mas apesar de tudo isso, e de até já termos ido à Lua, continuamos a ter muita miséria, pobreza e desespero.

2 comentários:

  1. Comentário muito breve, desde o homo sapiens até aos tempos de hoje,mas assertivo e muito concreto.

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  2. "Nunca em muitos milhares de anos de existência tínhamos conseguido criar tanto excedente, mas também nunca tínhamos vivido de forma tão miserável"

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