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quinta-feira, 28 de julho de 2022

 


14.          Livre-arbítrio

Na INFOPÉDIA encontramos a seguinte definição: “faculdade de decidir de acordo com a própria vontade”.

Apresenta ainda uma definição filosófica e outra religiosa[1].

Julgo que todos entendemos a ausência de livre-arbítrio se tivermos uma arma apontada á cabeça. Daí resulta a seguinte questão: Sem condicionamento prévio nem causa determinante teremos verdadeiramente o poder de decidir de acordo com a nossa própria vontade?

Somos nós quem decidimos quais são os critérios de atração física? Porque sentimos mais atração física por determinada pessoa em detrimento de outras? Porque sentimos um apelo tão forte para deixar descendente? Porque é tão difícil por termo à vida?

Alguns estudos recentes apontam a preferência sexual como inata.

Não tenciono abordar a questão das pessoas que sofrem discriminação (ou outras formas de violência) pelo facto de manifestarem escolhas sexuais contrárias às da maioria, mas ninguém contesta que algo inato não pode ter sido decidido (nem de forma livre, nem condicionada).

É exatamente o mesmo do que nascer com um pé de determinado tamanho.

Podemos escolher quem queremos que esteja ao nosso lado, mas não controlamos os fatores de atração nem a tendência sexual.

O tema do livre-arbítrio tem sido alvo de estudos e debates por vários cientistas, em particular de neurociências.

Até que ponto decidimos de forma consciente?

Uma experiência em particular ficou famosa[2]:

“Voluntários equipados com elétrodos na cabeça deveriam escolher entre mover um dedo da mão direita ou um dedo da mão esquerda.

Os participantes eram instruídos para escolher de forma intuitiva, sem pensar. O exato momento em que faziam o movimento era anotado.

(…)

O resultado foi surpreendente: o momento que os participantes relataram como sendo o da decisão ocorria depois de impulsos cerebrais e antes do movimento em si.

(…)

Os registos dos elétrodos mostraram que a decisão, de alguma forma, já tinha sido tomada antes de os participantes perceberem. Os sinais no cérebro já estavam em movimento antes da experiência subjetiva de realizar a escolha.

Será que o cérebro dos participantes realmente já tinha decidido? Será que a sensação de escolha era apenas uma ilusão?”

As controvérsias causadas por esta experiência não pararam de crescer desde então.

Como questiona o neurocientista Robert Sapolsky no seu livro “COMPORTAMENTO”, se o cérebro decide primeiro e só depois temos consciência dessa decisão, então onde fica o livre arbítrio?

Vai ainda mais longe ao levantar a questão de o cérebro decidir e mais tarde desenvolver uma narrativa para justificar a sua decisão. Uma espécie de justificação para a escolha efetuada.

Nesta fase é importante deixar claro que o nosso cérebro é constituído por duas partes distintas: O cérebro intuitivo (ou primitivo) e o cérebro analítico (ou racional).

O segundo é muito mais lento e consome muita mais energia. Por essa razão, é muitas vezes o intuitivo quem decide.

Podemos sentir-nos mais atraídos por A e, no entanto, escolher B para partilhar a vida. O cérebro analítico depois de pensar decidiu que havia outros critérios a considerar que acabaram por se revelar decisivos.

Não podemos negar que existe livre-arbítrio, mas provavelmente podemos dizer que nem sempre tomamos decisões de forma consciente.

Houve decisões que tivemos de tomar sem ter tido tempo para pensar. Certamente que vão voltar a acontecer. Provavelmente já lhe aconteceu perguntar-se: “por que carga de água fiz aquilo?”

Não se esqueça: a tendência natural é para usar o poupadinho (o cérebro primitivo consome menos energia).

É possível treinar o cérebro intuitivo. Exemplos fáceis são o treino militar e de desportistas de alta competição, onde certos exercícios / movimentos são repetidos exaustivamente não só com o intuito de os aperfeiçoar, mas principalmente para que se tornem automáticos. O objetivo é executar bem sem “perder tempo” a pensar.

Experimente começar por reagir e responder de forma mais pausada. Ganhe alguns segundos que podem ser decisivos para o cérebro racional ter tempo para intervir e tomar as rédeas do momento. Não pense que é fácil, mas pode sempre tentar.

Na selva, ao dar de caras com um predador, ficar a pensar no que fazer podia ser fatal. Atualmente, existem muito menos perigos que nos exijam uma reação rápida, do tipo faz primeiro e pensa depois. É por essa razão que provavelmente compensa demorar alguns segundos a reagir, de modo a dar tempo ao cérebro racional de escolher qual a melhor resposta.

A vida preparou-se para de forma instintiva evitar a morte. Por isso, em situações de perigo iminente, o cérebro intuitivo decide sempre primeiro, por maior que seja o treino. A vida procura manter-se viva e não quer saber do livre-arbítrio.

Não são apenas fatores biológicos que condicionam a nossa capacidade de decidir conscientemente. Existem também condicionantes sociais provocadas pela atividade humana: se não existirem alternativas, se só lhe for dada uma opção, então não tem escolha.

Se for obrigado a aceitar o primeiro emprego que lhe oferecerem por estar desesperado, porque precisa urgentemente de dinheiro para pagar dívidas e para trazer comida para a sua família, onde fica o livre arbítrio?

Claro que este é apena um exemplo extremo. Muitos outros exemplos, alguns bem mais simples, podiam ser apresentados, mas deixo isso há sua imaginação.

A sociedade necessita que os cidadãos sejam responsáveis pelos seus atos, caso contrário seria um salve-se quem puder.

Como se poderia responsabilizar alguém que alegasse não ter consciência dos seus atos?

O livre arbítrio pode não estar sempre presente nos nossos comportamentos, nem mesmo em todas as nossas decisões, mas todos sabemos que isso não pode servir de pretexto para condutas impróprias, mesmo que possa eventualmente servir de atenuante.

A formação da vida exigiu determinadas condições e muito tempo. Mantermo-nos vivos implica uma constante adaptação ao meio envolvente. Para a vida nada é tão importante.

Hoje sabemos que a resposta instintiva, nem sempre toma a melhor decisão.

Muitas vezes, entre duas opções (com tempo para pensar), escolhemos a que menos serve os nossos interesses. Certamente que já aconteceu com muita gente. Sabemos que foi a decisão errada, porque algum tempo depois arrependemo-nos (se conseguirmos, corrigimos).

As razões que estiveram na base da primeira escolha são complexas, mas tudo indica que não foi uma opção racional, ou se preferir, foi uma decisão consciente influenciada por impulsos que temos dificuldade em controlar.

A evolução tecnológica, e o conhecimento aprofundado sobre os nossos comportamentos biológicos, e o modo de funcionar do nosso cérebro, poderão dar-nos ferramentas, para um cada vez maior controlo sobre as nossas decisões, mas tudo leva o seu tempo.



[2] https://www.bbc.com/portuguese/noticias/2015/08/150814_vert_fut_mente_controle_hb


sábado, 16 de julho de 2022

 

Um só homem pode levar-nos ao apocalipse?

Ninguém questiona que se a Rússia conquistar Kiev, os ucranianos perdem a liberdade de decidir o seu futuro, tal como acontece com os chechenos e bielorrussos.

É perfeitamente natural que outros países se sintam ameaçados. Quem sabe quais são os planos de Putin... quanto mais próximo…

Putin odeia quem lhe faz frente, principalmente se os considera mais fracos.

Para Putin, os mais fracos devem subjugar-se aos mais fortes (por mais fracos, entenda-se os que têm menos poder militar).

Claro que neste caso existem agravantes: os ucranianos e os russos são vizinhos e falam idiomas suficientemente parecidos ao ponto de se conseguirem entender, e ambos fizeram parte da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS).

No entanto, os ucranianos mostraram vontade de se passarem para o outro lado: viver num regime democrático e com liberdade de expressão.

Imagine o péssimo exemplo que estariam a dar aos seus vizinhos de leste, se ainda por cima tivessem maior poder de compra.

Recentemente assisti numa reportagem diária sobre a guerra na Ucrânia, um ucraniano dizer que os soldados russos lhe perguntavam, porque é que eles tinham WC dentro de casa.

Mas há um outro fator que está na origem desta guerra e que se repete desde que o homem passou a viver em grandes grupos (cidades / estados).

Refiro-me obviamente ao facto de haver homens que têm demasiado poder, e que muitas vezes se servem desse poder, em nome de um povo que não estão a representar.

Estou fortemente convencido que a maioria dos russos não queria esta guerra, e que responderia não à pergunta, se tivessem a certeza do anonimato da resposta.

Uma coisa é um povo reunir-se em massa, nas praças das principais cidades espalhadas pelo país, e gritar em uníssono: “queremos um líder que nos conduza na guerra contra a Ucrânia”; ou coisa bem diferente, é entrar numa guerra sem ser consultado, ser manipulado acerca do que se está a passar, perder acesso a informação independente, e correr sérios riscos de ser punido sempre que falar livremente.

Putin tem o poder de destruir a vida a milhões de ucranianos, mas não só…

Não sei se algum dia deixará de haver pessoas com tanto poder, da mesma forma que não sei se algum dia deixará de haver pessoas com tanto dinheiro…

Quantos foram os responsáveis por demasiadas mortes nos últimos dez mil anos? E desses, quantos ainda hoje são admirados?

Façamos um pequeno exercício: Imagine que a Ucrânia começa a impor derrotas militares à Rússia. A certa altura, os generais russos começam a propor a retirada. Putin enraivecido manda atacar Kiev com misseis nucleares.

Alguns são intercetados, mas dois provocam um mar de destruição e muitos milhares de mortos.

O que é que faria o mundo? Nomeadamente os países que condenassem este ataque, e em particular, todos aqueles que defendem que a Ucrânia tem o direito de decidir livremente em que regime quer viver.

Para além de alimentos e outros bens necessários, enviariam máscaras antigás nuclear?

Alguns diriam que Putin foi longe demais?

E se esta guerra escalasse para uma guerra mundial que se tornasse nuclear?

Julgo que este cenário (bem como muitos outros) já foi concebido (mas não sei o resultado).

A pergunta que ficou no ar: será que quando Putin ordenasse o ataque a Kiev com mísseis nucleares, essa ordem insana seria obedecida?

Será que ele tem poder para pôr fim à humanidade?

(por instantes, esqueça essa coisa de haver alguns que sobrevivem dentro de bunkers e que recomeçariam tudo de novo).

 


13.          Sobrevivemos através da reprodução

A única forma de garantirmos a continuidade da nossa espécie é através da reprodução. Aliás, nesse aspeto somos iguais a todos os restantes seres vivos. Até o vírus Covid-19 que não tem metabolismo, apenas sobrevive reproduzindo-se (passando de uns hospedeiros para outros).

Individualmente a nossa passagem é efémera. No máximo conseguimos fazer algo que seja relevante. Mas a evolução da espécie necessita de tempo que ninguém consegue ter. Mesmo que com o passar dos anos, o desenvolvimento tecnológico permita-nos alterar a atual situação, a reprodução (muito provavelmente) terá sempre um papel determinante na continuidade da espécie, mesmo quando a evolução nos levar para situações longe de imaginar nos dias de hoje, como por exemplo, a gestação dar-se fora do corpo (útero) de uma mulher.

A natureza “tem conhecimento” da necessidade da reprodução para a continuidade da espécie. Na verdade, “sabe disso” muito antes de nós. Por isso, esse é um instinto natural tão forte: “querer ter filhos”.

Para de algum modo podermos sobreviver-nos através deles (transportam a nossa herança genética, para além de valores e conhecimentos que lhes tenhamos conseguido transmitir). Outro instinto natural fortíssimo é a sobrevivência, tão necessário para a reprodução: sobrevivemos para nos reproduzirmos e reproduzimo-nos para que a espécie sobreviva.

Chegar à idade reprodutiva é uma forma de seleção natural. Só quem lá chega pode reproduzir-se.

Claro que você conhece pessoas que não querem ter filhos. É um assunto complexo que suscita várias análises, mas que foge ao tema deste capítulo.

A grande maioria das pessoas quer ter filhos. Por agora é isso que estamos a analisar.

É graças à reprodução que a vida se tem prolongado desde que se formou há cerca de quatro mil milhões de anos atrás.

A vida sempre procurou garantir a sua continuidade e a reprodução foi a forma encontrada. Nada foi deixado ao acaso, nem sequer ao livre-arbítrio.

A sua importância é de tal ordem que a natureza não se ficou por criar instintos de maternidade e paternidade, foi ainda mais longe ao condicionar através da atração sexual, gerando tensões e/ou proporcionando prazeres que se libertam com atos que estão na base da procriação.

O que estou a querer realçar é a força deste instinto, ou se preferir deste “querer”. A grande maioria das pessoas quer ter filhos e acima de tudo quer poder ter os que quiser (mesmo que opte por não ter mais do que um).  

Não é fácil para ninguém, nem mesmo para um primeiro-ministro, um presidente ou até mesmo um ditador dizer à população do seu país que não podem ter filhos, ou que só podem ter um ou mesmo dois.

Ninguém ia gostar de ouvir esse tipo de ordem e muitos não estariam preparados para a aceitar. Mas é importante que a população um dia estabilize, e é desejável que o seu número esteja adequado à capacidade de criação de riqueza.

Muitos cientistas têm dito que o crescimento da população abranda ou até decresce com o aumento da qualidade de vida (em particular das mulheres).

Os factos parecem confirmar essa afirmação. Assim que surgem possibilidades de melhorar o nível de vida, os pais procuram ter menos filhos para poderem investir mais e melhor no futuro dos seus descendentes.

Pessoalmente creio que a vida agitada e com pouco tempo disponível para atividades pessoais e familiares também tem um peso relevante na decisão de muitas famílias de não terem mais do que dois filhos (muitas ficam-se por apenas um).

Estes dois fatores ajudam a compreender porque é que a diminuição da população está fortemente relacionada com os países onde o nível de vida atingiu valores mais elevados.

Mas independentemente do que está a acontecer em muitos dos países mais ricos e desenvolvidos, o facto é que a população mundial ainda não parou de crescer.

Também não é cem por cento seguro afirmar que um dia todos os países do mundo terão um bom nível de vida, de tal modo que o controlo da natalidade se fará por si só.

Por mais que nos custe, a população não poderá crescer sempre, infinitamente. Isso só poderá acontecer se e quando conseguirmos transportar população para planetas habitáveis (parecidos com o nosso).

Sendo o Universo infinito, essa poderia ser uma solução, mas ao que tudo indica, está longe de ser alcançada. Seria necessário conseguirmos produzir naves espaciais com capacidade de transportar pessoas e carga que viajassem a velocidades muito superiores à velocidade da luz.

Até que isso possa eventualmente acontecer, temos de viver com as condições que temos: Planeta Terra com os seus limites.

Está na hora de mudarmos de paradigma. Os recursos não são ilimitados, a economia não cresce sempre, não podemos usar e gastar como se nunca acabasse.

Temos de aprender a viver de forma sustentável.

Tentaram vender-nos a ideia que a diminuição da população coloca em risco a sustentabilidade da segurança social. A verdade é que isso, um dia, pode vir a ser necessário.

Antes de pensarmos na estabilização da população, devemos começar por pensar em planear a longo prazo, para sabermos para onde queremos e até onde podemos ir.

É preferível que sejamos nós a definir o nosso rumo, de modo realístico, do que optar por ir remendando.

A pobreza e a instabilidade são terrenos férteis, para oportunistas com discursos que procuram instalar medos.

Quantos podemos ser em face do que produzimos, do modelo económico que escolhemos e dos nossos valores?

Para que no limite, ninguém viva abaixo do limiar mínimo de qualidade de vida, que entendemos por aceitável.

Tudo isto sem esquecer que o planeta não é só nosso!


quinta-feira, 7 de julho de 2022

 


12.          O salário mínimo

Alguns países, muito poucos, conseguiram chegar a um ordenado mínimo que garante uma vida minimamente decente a quem o recebe.

Esse deve ser o objetivo do salário mínimo. Não devia fazer sentido trabalhar por menos do que isso. 

Imagine-se a ir para o seu local de trabalho, a passar lá no mínimo 8 horas por dia, durante 5 dias por semana, todo o mês, e receber um salário que mal dá para viver. É no mínimo estranho! Principalmente se tivermos em conta o desenvolvimento tecnológico que já atingimos.

São cerca de quarenta horas por semana a trabalhar para ganhar um salário que mal dá para sobreviver. Parece-me que algo não está certo!

Em Portugal, um individuo que receba por mês 1424€ (salário acima da média nacional), depois dos impostos fica com um salário líquido (já considerando os subsídios de férias e Natal) de 1208 Euros.

Em contrapartida, se recebesse o salário mínimo (já considerando os dois subsídios, e descontando apenas para a segurança social), receberia um salário líquido de 712€ por mês. Imagine-se a viver em Lisboa com esse valor: habitação, alimentação, transportes, saúde, vestuário e um fiozinho de lazer (talvez uma míni e um salgado, ou um copo de leite morno com um bolo, num café com TV).

Não é nada fácil encontrar um quarto por menos de 300 Euros/mês. Admitindo que conseguia, ficava com cerca de 400€ para todas as restantes despesas mensais. 

O salário mínimo representa a forma como o país vê a recompensa pelo trabalho, mas acima de tudo, qual o limiar mínimo de dignidade de vida, que considera aceitável, para qualquer um dos seus cidadãos.

Não acredito numa nação unida com desigualdades profundas.

 

Em baixo, os 10 salários mínimos mais elevados no Mundo (7 são da União Europeia).

 

OS 10 SALÁRIOS MÍNIMOS MAIS ELEVADOS NO MUNDO[1]

1. Luxemburgo - 2.142 euros (2020)

2. Austrália - 1.926 euros (2019)

3. Irlanda - 1.706 euros (2020)

4. Holanda - 1.680 euros (2020)

5. Bélgica -1.625 euros (2020)

6. Reino Unido- 1.585 euros (2020)

7. Alemanha - 1.584 euros (2020)

8. França - 1.539 euros (2020)

9. Canadá - cerca de 1.472 euros (2019)

10. Coreia do Sul - cerca de 1.273 euros (2019)

 

OS 10 SALÁRIOS MÍNIMOS MAIS ELEVADOS NA UE

1 - Luxemburgo - 2.142 euros

2- Irlanda - 1.706

3 - Holanda - 1.680

4 - Bélgica - 1.625

5 - Alemanha - 1.584

6 - França - 1.539

7 - Espanha - 1.108

8 - Eslovénia - 941

9 - Malta - 777

10 - Grécia – 758

 

Portugal, com cerca de 741 euros por mês (são 635 euros pagos 14 vezes), não entra nem no top 10 da UE (estes valores são de 2020. Em 2021, com base no mesmo cálculo, o valor sobe para cerca de 800 Euros brutos).

Para estas listas, apenas entram os países que têm um salário mínimo oficial.

Os países da Escandinávia ficaram de fora apesar dos salários médios praticados serem muito acima do nosso.

Suécia e Finlândia têm salários médios na casa dos 2500 Euros, enquanto a Noruega e Dinamarca chegam aos 3000€ (Portugal anda na casa dos 1300€).

Julgo que o salário mínimo deve permitir uma vida com alguma qualidade.

Estamos a falar de poder fazer férias, ter acesso a livros e à cultura, mesmo que seja de forma controlada, poder ir a um restaurante de vez em quando, ter uma casa minimamente confortável, ter carro, nem que seja para passear em família ao fim-de-semana, poder cuidar da saúde dentária, etc.

Este devia de ser o objetivo prioritário de todos os países.

Custa a compreender um país que não se esforce para alcançar essa meta para todos os seus cidadãos. Por uma questão de justiça, todos deveríamos lutar por esse desígnio.

Esse é o propósito por eleição para aferir a união de um povo.

Não nos podemos esquecer que não basta subir o salário mínimo. Caso contrário, corremos o risco de não conseguir evitar a fuga de técnicos especializados e/ou com formação superior para o estrageiro (situação ainda mais gravosa quando esses profissionais fazem falta ao país).

Portugal não tem um salário mínimo que garanta uma vida decente a quem o recebe. O salário médio é igualmente baixo. Apenas os salários de topo estão ao nível dos países mais desenvolvidos da União Europeia – por vezes até são notícia por os ultrapassarem).

Os representantes das confederações da indústria e comércio dizem que muitas empresas não têm condições para pagar “acima” do atual ordenado mínimo.

Dizem que muitas pequenas e microempresas do nosso tecido empresarial fechariam portas se tivessem de pagar ordenados superiores aos que pagam atualmente.

Não sei exatamente qual a dimensão de verdade do parágrafo anterior. Não sei se algumas dessas empresas não poderiam reduzir despesas libertando verbas para subir alguns dos salários.

Uma coisa é certa, não devia ser argumento para pagar um salário que não dá para viver com dignidade. O esforço não devia estar a ser suportado por apenas uma das partes.

Uma empresa para ser viável tem de pagar salários justos.

Não consigo considerar justo um trabalho de quarenta horas semanais (aproximadamente 180 horas por mês) que não permita ter uma vida com um mínimo de qualidade. Estamos a falar de valores que rondam os quatro euros por hora (em pleno século XXI, com o atual custo de vida).

Há vários anos (julgo que décadas) que ouvimos dizer nos meios de comunicação social que cerca de 20% dos portugueses vivem no limiar da pobreza.

Parece que não conseguimos sair desta situação!

Se um país não produz riqueza suficiente para garantir uma vida decente a todos os seus residentes, então creio que deveria perguntar-se o que pode fazer para alterar essa situação.

Todos os países têm uma determinada capacidade de gerar riqueza que depende dos seus recursos próprios. 

Talvez Portugal só tenha capacidade de produzir riqueza que garanta uma vida decente a oito milhões de habitantes (é apenas um exemplo).

Se reduzíssemos a população, a riqueza produzida na indústria e agricultura não sofreria de forma significativa, porque nesses setores, cada vez mais o trabalho é feito por máquinas.

Não havendo diminuição considerável da produção nesses dois setores (primário e secundário) havendo menos mercado interno, devido à redução da população, estavam criadas condições para aumentar as exportações.

Apenas haveria reduções no setor terciário (comércio e serviços), porque a atividade nesses setores é proporcional à população servida.

Se mesmo assim não desse para termos o salário mínimo que permita qualidade de vida, então teríamos de reduzir ainda mais a população (talvez Portugal só tenha capacidade de gerar riqueza para 6 ou 7 milhões…).

O que pretendo dizer é que devia funcionar ao contrário. Devíamos planear de modo que a população estivesse sempre adequada à nossa capacidade de produzir riqueza.

Mas nem isso funciona, se os ricos não pagarem impostos, ou se ficarem com todos os aumentos de riqueza para si.

Isso nunca foi feito: ter como objetivo número um garantir um salário mínimo que permita viver com dignidade.

Até hoje, o país nunca teve esse objetivo.

Mesmo após o 25 de Abril, a solução tem sido sempre de adaptação ao que se consegue, ou em alternativa, procurar melhor qualidade de vida lá fora. Há políticos que o incentivam.

Nunca nenhum político teve coragem de referendar a seguinte escolha: ir reduzindo a população até aos x milhões de habitantes (para resolver este problema de vez), ou continuar como estamos, e quem não estiver bem que se mude (emigre para conseguir uma vida melhor).

No fundo seria: “ou fazemos tudo para conseguirmos que isto dê para todos, ou deixamos como está”. Claro que este plano tinha de ser detalhado e ter prazos (razoáveis).

Mas falta responder a uma questão: Será que o país não tem capacidade de criar riqueza suficiente para os atuais dez milhões de habitantes? Quando digo suficiente, refiro-me (mais uma vez) a que ninguém trabalhe por um salário que não permita uma vida minimamente decente.

Em Portugal, a fuga ao fisco, através dos paraísos fiscais representa cerca de mil milhões de euros[2]. Se somarmos a este valor, o IVA não declarado, certamente que valor total será ainda maior.

Obviamente que isto tem implicações na capacidade do Estado de subsidiar o ordenado mínimo, o que poderia ser uma forma de resolver, ou atenuar, o problema.

Mas a ideia que vingou foi: “Isto não dá para todos”. “Que se salve quem puder”. “Quem não conseguir que se faça à vida”.

Claro que a redução da população teria de ser relativamente lenta por causa da sustentabilidade da segurança social.

Sendo gradual o esforço exigido às gerações envolvidas, até à estabilização da população no número de habitantes adequados aos recursos do país, o processo não seria tão custoso.

Mas há outras ações que podem ser adotadas e que ajudavam a produzir os resultados pretendidos (melhorar o nível de vida dos portugueses, em particular dos mais pobres, pelo menos até que se consiga atingir o mínimo aceitável).

Por exemplo, durante uma fase transitória (até que todas as empresas tivessem capacidade de pagar um salário mínimo ao nível de países com a nossa dimensão, como a Bélgica, Suíça, Holanda, Suécia e Áustria) o estado podia ajudar os trabalhadores que recebem os salários mais baixo, por exemplo, atribuindo um determinado abono para melhoria de vida.

Outra coisa extremamente importante era acabar de vez com andarmos a financiar as ganâncias dos bancos. Nos últimos dez anos, já deve ter ultrapassado os quinze mil milhões de euros. Muito dinheiro que podia ter ajudado muitos portugueses e não apenas alguns gananciosos.

Recordo-me de ouvir falar dos cheques publicitários que algumas pessoas recebiam na caixa do correio e que diziam qualquer coisa como: “pegue lá cinco mil euros para tirar umas férias bem merecidas”. E quem ia com aquele papelinho ao banco, geralmente saía de lá com os ditos 5000€.

E malta que pedia empréstimo à habitação, por vezes em situação relativamente precária, e ainda lhes ofereciam não sei quantos mil euros a mais para mobilar a casa e comprar corro novo. Toda a gente comentava, mas ninguém de direito fez absolutamente nada para parar este tipo de “coisas” que anos mais tarde deu na Troika.

Também não sou da opinião que ter uma companhia aérea seja mais importante do que acabar com a pobreza de um país.

Ouvi dizer na TV que a TAP é estratégica porque com ela várias empresas conseguem exportar para determinados destinos.

Se isso é verdade e se manter essas exportações for estratégico para o país, então mantenha-se um “tapezinha” para esses destinos. Para os outros, que há oferta mais do que suficiente, deixe-se o mercado a funcionar que por si só garante todos os voos.

Manter uma companhia aérea com prejuízo só para podermos afirmar que temos uma companhia aérea, para além de denotar tiques de aristocracia, demonstra total desconsideração pelos (no mínimo) dois milhões de portugueses que vivem no limiar da pobreza.

E os submarinos que custaram uma verdadeira fortuna? Precisamos deles para garantir que não vão pescar nas nossas águas marítimas? Não há forma mais económica de obter os mesmos resultados? Por que não usar drones como aqueles que são utilizados para fiscalizar a vários quilómetros de distância o conteúdo de barcos e cargueiros. Fazem-no sem ser vistos recorrendo a câmaras de longo alcance e de enorme precisão.

Mais uma vez parece que preferimos satisfazer as nossas vaidades em vez de procurar garantir a todos os portugueses uma vida decente.

Muito mais pode ser feito, como por exemplo, exercer pressão para que a União Europeia combata a fuga de capital para os paraísos fiscais (é difícil de entender este consentimento).

Não alterar a lei para que empresas (como por exemplo a EDP) não tenham de pagar o imposto de selo.

Não vender empresas que dão lucro, como a ANA e a EDP.

Não permitir desigualdades obscenas e injustificadas (ninguém devia poder acumular riqueza equivalente à de “tantos” milhares de pessoas) – não há super-homens.

Se o país for gerido a pensar no bem comum, de certeza que conseguiremos melhores resultados e de forma bem mais rápida.

O objetivo final tem de ser este: conseguir que a riqueza produzida permita a todos viver minimamente bem (mesmo que alguns vivam muito melhor).



[1] https://tvi24.iol.pt/economia/salario-minimo/os-paises-com-os-salarios-minimos-mais-elevados

[2] https://www.dn.pt/dinheiro/fuga-anual-ao-fisco-em-portugal-chega-a-900-milhoes-e-dava-para-contratar-50-mil-enfermeiros-13058329.html