Falta de consideração, ou o quê?
Dizem as
notícias que até 2030, o Estado Português vai necessitar de trinta e quatro mil
e quinhentos professores para fazer face aos pedidos de reforma nesse mesmo
período.
Quando oiço
esta notícia, não consigo deixar de pensar na história da Maria.
A Maria vem de
uma família humilde. Enquanto estudava tinha que ajudar os pais, nomeadamente
com atividades domésticas ou a cuidar do irmão mais novo. Mesmo assim, com
esforço, muita dedicação e empenho, conseguiu média suficiente para entrar numa
universidade pública de prestígio (Universidade Nova de Lisboa).
O Estado
Português atento à situação da Maria resolveu premiar o seu esforço e concedeu-lhe
uma bolsa, privando-a das despesas com as propinas e ainda ajudando noutras
despesas curriculares.
A Maria
termina a licenciatura com uma boa nota e tenta iniciar a sua atividade profissional
regressando à terra natal que fica a aproximadamente 100 km de Lisboa.
Ao fim de poucos
anos, sempre com contratos de trabalho que não lhe permitiam auferir o suficiente
para contruir uma vida, a Maria regressou à capital.
Já passaram
22/24 anos desde que a Maria começou a trabalhar com formação pública de
professora na língua de Camões e ainda não passou para os quadros.
Ou seja, após
todos estes anos, não muito longe de atingir meio século de vida, a Maria
continua, ano após ano, sem saber em que escola vai trabalhar, se vai ter
horário completo, ou sequer se vai conseguir ter trabalho.
Como nunca
deixou de ser professora contratada, a Maria está sempre a começar de novo. Ano
após ano, em termos de salário é sempre como se fosse o primeiro.
Enquanto um
professor dos quadros vai subindo de escalão, um professor contratado ganha
sempre o valor inicial, o mesmo de há vinte e tal anos (no caso da Maria)
apenas atualizado à inflação.
O empregador (Ministério
da Educação) trata assim de forma desigual professores, mesmo não tendo como
justificar essa discriminação com critérios pedagógicos ou profissionais[1].
A esse
respeito, julgo que a falta de critério vem de trás, quando um determinado
professor que se formou numa universidade privada ganha vantagem sobre outro
que se formou numa universidade pública, porque o primeiro terminou o curso com
uma nota superior ao segundo.
Na maioria dos
casos, acontece que o segundo teve nota para entrar na universidade pública e o
primeiro não. Acresce que o Ministério de Educação não controla a nota do
primeiro e todos sabemos que um 16 numa privada pode não ser superior a um 14
numa pública.
O Estado deve
garantir a Defesa, Justiça, Saúde e Educação.
À semelhança
da saúde, também com a educação é possível saber quantas escolas são necessárias,
para quantos alunos e o número adequado de professores em função do critério
alunos por sala de aula.
Não faz sentido
que o Estado Português gaste dinheiro dos contribuintes a formar professores
para depois os deixar numa situação precária por décadas.
Ao princípio
reconheceu o esforço da Maria e deu-lhe uma mão, para pouco depois a deixar na
mão.
Pergunto-me
porquê? O que faz o governo português (através do ministério da educação) ter
este comportamento?
À partida,
tenderia a dizer que seria para poupar. Afinal, um professor que ganhe sempre o
mesmo durante décadas, fica muito mais em conta que um professor que foi
subindo na carreira.
Se assumirmos
que um profissional com vários anos de experiência tem geralmente maior capacidade
de produzir do que tinha quando iniciou a sua carreira, então facilmente
concluímos que o empregador está a beneficiar de um trabalho com especialização
e com experiência, mas que não é pago enquanto tal.
Mais uma vez,
parece que a iniciativa com vista a terminar com esta injustiça parte de fora
(Bruxelas). O que leva a concluir que, em muitos casos, o governo português só
toma iniciativas quando é pressionado para o fazer, e que a maioria de nós, só
se preocupa com os problemas, quando estes lhes batem à porta.
Se não é falta
de consideração, então o que é?
Sem comentários:
Enviar um comentário