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sexta-feira, 19 de novembro de 2021

 

Falta de consideração, ou o quê?

 

Dizem as notícias que até 2030, o Estado Português vai necessitar de trinta e quatro mil e quinhentos professores para fazer face aos pedidos de reforma nesse mesmo período.

Quando oiço esta notícia, não consigo deixar de pensar na história da Maria.

A Maria vem de uma família humilde. Enquanto estudava tinha que ajudar os pais, nomeadamente com atividades domésticas ou a cuidar do irmão mais novo. Mesmo assim, com esforço, muita dedicação e empenho, conseguiu média suficiente para entrar numa universidade pública de prestígio (Universidade Nova de Lisboa).

O Estado Português atento à situação da Maria resolveu premiar o seu esforço e concedeu-lhe uma bolsa, privando-a das despesas com as propinas e ainda ajudando noutras despesas curriculares.

A Maria termina a licenciatura com uma boa nota e tenta iniciar a sua atividade profissional regressando à terra natal que fica a aproximadamente 100 km de Lisboa.

Ao fim de poucos anos, sempre com contratos de trabalho que não lhe permitiam auferir o suficiente para contruir uma vida, a Maria regressou à capital.

Já passaram 22/24 anos desde que a Maria começou a trabalhar com formação pública de professora na língua de Camões e ainda não passou para os quadros.

Ou seja, após todos estes anos, não muito longe de atingir meio século de vida, a Maria continua, ano após ano, sem saber em que escola vai trabalhar, se vai ter horário completo, ou sequer se vai conseguir ter trabalho.

Como nunca deixou de ser professora contratada, a Maria está sempre a começar de novo. Ano após ano, em termos de salário é sempre como se fosse o primeiro.

Enquanto um professor dos quadros vai subindo de escalão, um professor contratado ganha sempre o valor inicial, o mesmo de há vinte e tal anos (no caso da Maria) apenas atualizado à inflação.

O empregador (Ministério da Educação) trata assim de forma desigual professores, mesmo não tendo como justificar essa discriminação com critérios pedagógicos ou profissionais[1].

A esse respeito, julgo que a falta de critério vem de trás, quando um determinado professor que se formou numa universidade privada ganha vantagem sobre outro que se formou numa universidade pública, porque o primeiro terminou o curso com uma nota superior ao segundo.

Na maioria dos casos, acontece que o segundo teve nota para entrar na universidade pública e o primeiro não. Acresce que o Ministério de Educação não controla a nota do primeiro e todos sabemos que um 16 numa privada pode não ser superior a um 14 numa pública.

O Estado deve garantir a Defesa, Justiça, Saúde e Educação.

À semelhança da saúde, também com a educação é possível saber quantas escolas são necessárias, para quantos alunos e o número adequado de professores em função do critério alunos por sala de aula.

Não faz sentido que o Estado Português gaste dinheiro dos contribuintes a formar professores para depois os deixar numa situação precária por décadas.

Ao princípio reconheceu o esforço da Maria e deu-lhe uma mão, para pouco depois a deixar na mão.

Pergunto-me porquê? O que faz o governo português (através do ministério da educação) ter este comportamento?

À partida, tenderia a dizer que seria para poupar. Afinal, um professor que ganhe sempre o mesmo durante décadas, fica muito mais em conta que um professor que foi subindo na carreira.

Se assumirmos que um profissional com vários anos de experiência tem geralmente maior capacidade de produzir do que tinha quando iniciou a sua carreira, então facilmente concluímos que o empregador está a beneficiar de um trabalho com especialização e com experiência, mas que não é pago enquanto tal.

Mais uma vez, parece que a iniciativa com vista a terminar com esta injustiça parte de fora (Bruxelas). O que leva a concluir que, em muitos casos, o governo português só toma iniciativas quando é pressionado para o fazer, e que a maioria de nós, só se preocupa com os problemas, quando estes lhes batem à porta.

Se não é falta de consideração, então o que é?

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