Pesquisa

quarta-feira, 24 de junho de 2015

Quinta do Noval 1981


Cumprindo com a tradição de uma família com raízes no douro vinhateiro, abri ontem, para comemorar o nascimento da minha primeira filha, um Porto Quintal do Noval do meu ano de nascimento 1981, que me foi oferecido pelo meu Pai.
É sempre difícil abrir uma garrafa especial, não pelo seu valor monetário que também pode ter o seu peso é certo, mas pelo valor sentimental e de posse de algo único, que mais ninguém tem. Eu sei que, como aquela, muitas mais garrafas foram para o mercado naquele ano, mas cada garrafa é única. Não há outra igual.
Venci o meu sentimentalismo ou avareza, enchi-me de coragem e substituí-os pela minha filha. Ao bebê-lo transferi esse tesouro único que tinha para a minha filha, só ela importa, só ela é única, só ela interessa conservar, tudo o resto é acessório. Orgulhoso pela tradição e ainda mais por ter conquistado um objectivo de vida, a minha filha, abri a garrafa. Uma tradição só se materializa se for praticada. Se não tivermos coragem de a levar em frente, então não é tradição.
Não quis pensar muito no assunto. Não lhe quis dar importância ou ainda me arrependeria. Agarrei nela como se fosse igual ao vinho tinto que tinha servido para jantar. Em menos de um minuto estava com o saca-rolhas espetado na rolha. Já não havia volta a dar.
A rolha desfez-se. Estava colada no gargalo. Enquanto lutava para evitar que a rolha se desfizesse por completo caindo no Porto, ia sentindo o aroma do néctar a libertar-se pela rolha. Que aroma. Nunca mais me esquecerei. Vai ser como aqueles cheiros de infância que estão cravados na minha cabeça, que me comovem quando os sinto, quando me lembro da minha infância, quando me lembro da Aldeia e pelos campos por onde passeava.
Com muito jeitinho e determinação lá consegui extrair aquele obstáculo na minha caminhada para o olimpo. Obstinadamente a rolha resistia ferozmente a largar de ânimo leve o precioso néctar que durante quase 34 anos conservara. Como eu a compreendi quando finalmente o degustei. Uma cor de caramelo lindo e um sabor de inigualável prazer. Que ano.
Obrigado a todos os que ajudaram na produção de aquele Quinta do Noval de 1981 (alguns poderão já não estar entre nós) e um especial obrigado e bem-haja ao meu pai, por ter dado sequência à tradição e por me ter proporcionado ontem aquele momento mágico que ficará para sempre gravado na minha memória. Infelizmente a minha mulher não é apreciadora de bebidas alcoólicas. Teria sido ainda melhor, correcção, teria sabido ainda melhor se o partilhasse com ela.
Irei estar atento e adquirir neste ano (no caso do ano de 2014 ter sido vintage), ou nos próximos, uma garrafa de Porto para a minha filha do ano de 2014. Espero que ela goste, que o conserve, que perceba o seu significado e o respeite, que tenha a determinação e coragem que o pai teve e que, preferencialmente, disfrute dele. Espero estar com ela nesse dia, para lhe poder dizer “Para mim, o ano de 2014 foi o melhor da minha vida, foi a todos os níveis um grande ano, inesquecível”.


PS – Acho que vou à procura de outra garrafa de 1981 e iniciar outra tradição, fazer uma árvore genealógica da família e juntá-la à do meu pai (ele não teve coragem de abrir a dele).

Sem comentários:

Enviar um comentário